segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Indústrias de medicamentos buscam no STJ extensão para suas patentes

Aguardam julgamento no Superior Tribunal de Justiça (STJ) 33 recursos que afetam diretamente a população brasileira. A discussão envolve o pedido de extensão da vigência de patentes de medicamentos e, portanto, o monopólio na comercialização de drogas que são usadas no tratamento de muitas doenças como hipertensão e leucemia. Quanto mais estas patentes são prorrogadas, mais se adia o surgimento do genérico.

As patentes desses medicamentos são do tipo “pipeline”. A atual Lei da Propriedade Industrial (Lei n. 9.279/1996) criou esse mecanismo para proteger invenções das áreas farmacêutica e química, que não poderiam gerar patentes até aquela época. Pelo “pipeline”, os laboratórios tiveram um ano para requerer a patente ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), e a validade foi fixada considerando o primeiro depósito no exterior. As patentes de invenção no Brasil valem por 20 anos a partir da data do depósito.

O tema não é novo no STJ. A Terceira e Quarta Turma já julgaram alguns desses recursos. Um deles, relatado pelo ministro João Otávio de Noronha, inviabilizou o pedido de extensão da patente do Viagra, indicado para disfunção erétil (Resp 731.101). Outro foi o que pôs limite no prazo de patente do Diovan, indicado no tratamento da hipertensão arterial (Resp 1.145.637). Neste caso, o julgamento foi unânime, seguindo o posicionamento do desembargador convocado Vasco Della Giustina. Conforme o artigo 42 da Lei n. 9.279/96, a patente confere ao titular o direito de impedir que terceiro produza, use ou coloque à venda o produto objeto da patente.

Em todas as instâncias do Judiciário, há mais de cem ações envolvendo medicamentos diversos, segundo dados do INPI. A Justiça Federal analisou recentemente o caso envolvendo a comercialização do Xenical, fabricado pelo laboratório F. Hoffmann-La Roche e indicado para o tratamento da obesidade. Também analisou um processo envolvendo a fabricação do medicamento Hepsera, pelo laboratório Institut of Organic, indicado para controle da pressão arterial. Outro caso, que aguarda julgamento, mas no STJ, é a patente do anticoncepcional Yasmim, fabricado pela Schering.

As patentes “pipeline”
Nos processos relacionados ao “pipeline”, diversas multinacionais buscam harmonizar sua patente nacional com a concedida no exterior. Porém, as últimas decisões do STJ vêm mantendo o prazo estabelecido pelo INPI, que é de 20 anos a partir do primeiro depósito, também desconsiderando possíveis extensões em outros países.

Esse entendimento desagrada aos fabricantes de medicamentos. “Entendemos que o prazo de patente que expira aqui é o mesmo que expira lá fora”, afirmou o advogado Gustavo Moraes, responsável pela defesa da patente do Viagra no STJ. Segundo ele, a patente desse medicamento no Brasil vai expirar um ano antes do que no resto do mundo, o que seria uma violação à propriedade intelectual.

O procurador-chefe do INPI, Mauro Maia, explica que as discussões acontecem na Justiça porque as multinacionais fazem um primeiro depósito no exterior e abandonam o pedido, realizando outra solicitação posteriormente. Assim, pedem que os 20 anos sejam contados a partir do segundo pedido, e não do primeiro.

Argumentos judiciais e a posição do STJ

Há também uma peculiaridade: nos Estados Unidos, às vezes, existe um lapso entre a data de concessão da patente e a autorização para a comercialização. A legislação norte-americana prevê uma indenização por este período, de forma que, se um produto demorou três anos para chegar às prateleiras, há um acréscimo de três anos na validade da patente. E as empresas recorrem, também, querendo esse prazo adicional no Brasil.

O STJ vem decidindo que o prazo de 20 anos deve ser contado a partir do primeiro depósito no exterior, ainda que esse tenha sido abandonado ou haja extensão. Essa posição foi defendida no julgamento do Recurso Especial 1.092.139, em que o laboratório Novartis queria exclusividade na comercialização de derivados da pirimidina, substância utilizada na fabricação do Glivec, usado para tratar adultos com leucemia mielóide. O STJ, seguindo o voto do ministro Paulo de Tarso Sanseverino, considerou o primeiro depósito feito na Suíça, e não o registro no Escritório Europeu de Patentes.

O regime de “pipeline” vem sendo questionado no Supremo Tribunal Federal (ADI 4.234/2008) por supostamente afrontar o artigo 5º, incisos XXIX e XXXVI, da Constituição Federal. O primeiro inciso institui a proteção aos inventos industriais, e o segundo dispõe sobre o direito adquirido. A justificativa é que não haveria novidade aqui nos produtos comercializados no exterior, especialmente porque o Brasil não concedia patentes para tais produtos até a Lei da Propriedade Intelectual, de 1996.

Concessão de uma patente
Para ter uma patente concedida, segundo a lei, é preciso que haja novidade, atividade inventiva (não ser óbvia) e aplicação industrial. Sua duração é de 20 anos e corresponde ao período médio de vida que a sociedade atribui a uma tecnologia ou, no caso dos medicamentos, ao tempo necessário para que empresas tenham o retorno do dinheiro investido. Em troca da patente, as empresas oferecem ao Estado a descrição do invento.

Não há violação quando o uso do medicamento é para finalidade experimental, relacionado a estudos ou pesquisas ou que resulte na produção de informações de dados ou resultados de testes. O que se proíbe é a comercialização dos produtos, razão esta que faz com que a indústria de genéricos reivindique uma fatia do mercado. A patente é concedida pelo INPI, uma autarquia federal, com sede no Rio de Janeiro.

O advogado Gustavo Moraes entende que as decisões judiciais estão na contramão do ideal de patente concebido pelo legislador e expressam insatisfação da indústria farmacêutica com a não concessão da extensão em alguns casos. “Quando alguém inventa e é bom, depois todos querem copiar”, assinala. Já o procurador-chefe do INPI esclarece que não há quebra de patente nos casos julgados pelo Judiciário. “O que as empresas buscam é estender uma situação insustentável de monopólio”, acusa Mauro Maia.

Mercado de genéricos

Segundo o advogado Aristóvolo Freitas, da Pró Genéricos, associação que representa oito laboratórios e quase 90% do mercado de genéricos no Brasil, não se sustenta o argumento de que as decisões do Judiciário violam os princípios da propriedade industrial e comprometem futuros investimentos com pesquisa e desenvolvimento. “A patente é importante para o país e, sem ela, não pode haver sequer genéricos”, alega o advogado.

A associação atua na condição de assistente do INPI nos processos envolvendo patentes de medicamentos em muitas das ações no Judiciário. Isso foi possível graças a uma decisão do STJ, firmada no Recurso Especial 1.128.789, na qual ficou estabelecido que não se exige que terceiro possua uma efetiva relação jurídica com o assistido, sendo suficiente a possibilidade de que alguns direitos sejam atingidos pela decisão judicial.

Os genéricos são cópias de medicamentos com patentes expiradas. No Brasil, foram instituídos em 1999 com a promulgação da Lei n. 9.787. Seus fabricantes não necessitam fazer investimentos em pesquisa para o seu desenvolvimento, visto que as formulações já estão definidas pelo medicamento de referência. Também não precisam fazer propaganda, pois não há marca a ser divulgada, razão de o preço ser menor.

“As brigas na Justiça não têm nada a ver com quebra de patentes”, reitera o procurador-chefe do INPI. “O que se discute é a extensão indevida de patente”, garante Maia. Segundo o autor Nuno de Pires de Carvalho, no livro “A Estrutura de Marcas e Patentes”, as patentes não são instrumentos de política industrial, são componentes de um conjunto de instituições jurídicas que moldam a sociedade de uma forma eficiente.

Movimento de mercado
O mercado mundial de medicamentos movimentou no último ano o equivale a um total de US$ 752 bilhões, segundo estudo divulgado pela Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma). No Brasil, foram mais de US$ 15 bilhões investidos. “Se for olhar do ponto de vista econômico, vale a pena brigar na Justiça pela patente”, assinala Mauro Maia, “pois quaisquer três meses resultam em uma grande diferença na receita da empresa”.

A venda de um medicamento pode ter o impacto de até 30% no faturamento da empresa, segundo levantamento do INPI. De acordo com dados do IMS World Review, somente um em cada cinco mil compostos pesquisados chega aos pacientes, e sete entre dez drogas não cobrem os custos com pesquisa e desenvolvimento. O estudo informa ainda que somente 27% dos produtos no mercado são protegidos por patentes. Os Estados Unidos são o país com maior número de patentes na área de medicamentos, com 45.790, e o Brasil ocupa a 24ª posição, com 480.
 
A notícia refere-se aos seguintes processos:
retirado do site do STJ

Justiça suspende liminar que proibia médico de fazer ortotanásia

Depois de mais de três anos de debates nos meios jurídicos e médicos e na sociedade, a Justiça Federal revogou a liminar que suspendia a regulamentação da ortotanásia no país. O procedimento médico, que consiste na suspensão de tratamentos invasivos que prolonguem a vida de pacientes em estado terminal, foi regulamentado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) em novembro de 2006.
O juiz Roberto Luis Luchi Demo, da 14ª Vara Federal, julgou improcedente o pedido do MPF (Ministério Público Federal), que considerava a medida inconstitucional. A decisão será publicada esta semana no Diário Oficial da União, segundo o CFM.

A ortotanásia só pode ser realizada quando não é mais possível a cura do paciente. Para fazê-la, o médico precisa ter autorização do próprio paciente ou de sua família, em caso de incapacidade do primeiro. Essa conduta médica é considerada ética e tem manifestações favoráveis da Igreja Católica. A morte, em 2005, do papa João Paulo II, é um dos exemplos mais conhecidos de ortotanásia.
No Brasil, o exemplo mais famoso é a morte do ex-governador de São Paulo Mário Covas, em 2001, que levou o Estado a ser o único do país a aprovar uma lei garantindo o direito do cidadão a uma morte digna. Covas teve um câncer reincidente na bexiga e preferiu passar os últimos momentos de vida na companhia da família, recebendo apenas tratamento paliativo.
Segundo o presidente do CFM, Roberto d'Avila, a liminar que suspendeu a regulamentação da ortotanásia no país, há três anos, era reflexo do desconhecimento da sociedade sobre sua prática, confundida com outras tipificadas como crime, como a eutanásia, quando a morte de paciente terminal é provocada. O lado bom foi que isso fez com que discutíssemos mais profundamente o assunto com toda a sociedade, colocou d'Avila.

Ele disse ser importante esclarecer que existe um grupo de pacientes em que a cura não é mais possível. Nesses casos, o doente continua sendo acolhido, mas pode optar por tratamento paliativo, com uso de sedativos e analgésicos em quantidades adequadas, no lugar de procedimentos que não lhe trariam benefícios e poderiam prolongar a morte com dor.
A revogação da liminar ocorreu depois que o próprio MPF (Ministério Público Federal) revisou a ação inicial e reconheceu que ela deveria ser acolhida. Segundo argumentação da procuradora Luciana Loureiro Oliveira, a ortotanásia não constitui crime de homicídio, ao contrário da eutanásia, e o CFM tem competência para editar a resolução que a regulamenta, que não versa sobre direito penal e, sim sobre ética médica e consequências disciplinares.

Para d'Avila, a decisão da Justiça foi um avanço da compreensão da sociedade sobre o tema. Além disso, retira a insegurança criada nos médicos que viram uma conduta moral na medicina sendo tratada, temporariamente, como ato ilegal. É um processo que a própria sociedade acaba exigindo de nós. Por isso, os médicos vinham sendo orientados a sempre conversar e preservar a autonomia de seus pacientes.

retirado do site do IBDFAM