quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Transexual Altera Gênero sem Cirurgia de Transgenitalização

A 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Sergipe (TJSE), em decisão unânime, concedeu a transexual o direito de ter o nome no registro civil alterado para o gênero feminino sem a necessidade de cirurgia de transgenitalização. A assistente social A. L. S. teve seu pedido negado em primeira instância. O Ministério Público de Sergipe recorreu sustentando que o autor da apelação (fls. 243/252) apesar de ter nascido homem se identifica, desde a adolescência, psicológica e corporalmente com o sexo feminino, adquirindo hábitos e postura características do gênero.
O relator da apelação, Des. Ricardo Múcio de Abreu Lima citou em seu voto a vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Maria Berenice Dias, afirmando que “em tempos passados, a definição do sexo da pessoa se dava unicamente por meio da genitália. Tal entendimento não se coaduna com as necessidades hodiernas, haja vista a designação do sexo ser analisada sob o prisma plurivetorial e não univetorial, como menciona Maria Berenice Dias”.
O IBDFAM participa como amicus curiae na ADI 4275 que tramita no STF, cuja pretenção é reconhecer o direito dos transexuais, que assim o desejarem, à substituição de prenome e sexo no registro civil, independentemente da cirurgia de transgenitalização.
Para a advogada, pós-doutora pela Universidade de Montréal e Integrante da Comissão Especial da Diversidade Sexual do Conselho Federal da OAB, Tereza Rodrigues Vieira, a decisão da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Sergipe é importante ao reconhecer que o transexual não consegue viver com o desconforto e o constrangimento de um nome que não corresponde à sua realidade. Tereza considera que adequar nome e gênero são direitos da personalidade, portanto, imprescindíveis para o desenvolvimento da pessoa em sociedade. A decisão é inovadora também por reconhecer a alteração do registro sem a necessidade de cirurgia de transgenitalização.
A advogada argumenta que nem todos desejam a cirurgia ou conseguem realizá-la, mas todos aspiram o reconhecimento, uma vez que a cirurgia não transforma homem em mulher ou vice-versa. “Assim, a realização da cirurgia não é determinante para o reconhecimento. O mais importante é o gênero da pessoa, como ela se sente, como se porta, como se veste. Quando tratamos alguém no gênero feminino, por exemplo, não estamos vendo sua genitália, portanto o que importa é a forma como a pessoa se coloca diante da sociedade, seu comportamento, seus trajes, seus gestos.”, explica.
Mudança de nome
A produtora musical e professora de canto Yamê Aram, teve que abandonar sua carreira na música erudita. Aos 27 anos, quando descobriu sua verdadeira identidade sexual, precisou abandonar a carreira consolidada e se reinventar como artista, já que o único trabalho que restou, após a mudança, foi o de professora de canto. “É impressionante como foi libertador descobrir que eu era transexual. Na época eu dava aula em uma escola e a maioria dos meus alunos eram adolescentes, eles foram os que mais me ajudaram no processo para assumir-me”, relata.
Uma das barreiras enfrentadas por Yamê após ter assumido sua identidade de transexual foi e continua sendo a dificuldade para alterar seu registro civil. “Procurei o fórum de Belo Horizonte, mas, eles simplesmente não souberam como encaminhar-me ou dar-me qualquer informação. Saí totalmente decepcionada, pois, para mim, o nome do meu registro nem de longe é meu. Ele não condiz com o que sou, é humilhante e constrangedor quando me chamam no masculino”, destaca.
Além disso, mudar o nome é, para Yamê, um ato político e uma parcela importante da construção do gênero. “Assim como o tipo de sexo que pratico, as roupas que visto, o meu corte de cabelo e minha visão de mundo, meu nome é parte do que sou. Não quero ser nada pela metade. Não quero meias concessões para que a metade que eu não conquistei fique a me gritar que eu só posso ser aquilo que terceiros me permitem. Não, eu tenho o direito de ser por inteiro”, reflete.
Com relação as barreiras para a mudança de nome, Tereza Rodrigues Vieira acredita que ainda existe preconceito do Judiciário quanto à matéria. Ela explica que alegar impossibilidade jurídica do pedido não é mais motivo para se rejeitar o pedido, diante da inexistência de impeditivos legais expressos em nosso ordenamento jurídico. O princípio da dignidade da pessoa humana e da inviolabilidade da intimidade, consagrados constitucionalmente, no 1º., III, art. 3º. IV e art. 5º., X, são fundamentais para a promoção do bem de todos, sem preconceito ou discriminação. “Obrigar o transexual a conservar o seu sexo de registro apenas em nome da realidade biológica é cruel demais, é desconhecer os aspectos psicossociais do indivíduo; é fechar os olhos para a singularidade e subjetividade de cada um. A vida é dinâmica e o direito não pode contribuir para a infelicidade das pessoas”, enfatiza.
Transtorno de gênero
Em seu voto o Des. Ricardo Múcio Santana de Abreu Lima relatou: "Pois bem, o transexualismo, definido como patologia pela Classificação Internacional de Doenças, consiste em uma anomalia da identidade sexual, em que o indivíduo se identifica psíquica e socialmente com o sexo oposto ao que lhe fora determinado pelo registro civil". Para Tereza, que participa de um movimento internacional que luta pela despatologização, nem sempre o Judiciário vê a questão como patológica, mas como uma maneira de ser, de exercer a identidade sexual. Ela explica ainda que a transexualidade é mencionada na Classificação Internacional de Doenças apenas para demonstrar que o indivíduo que já realizou as cirurgias, procedeu de acordo com os padrões éticos estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina, não caracterizando lesão corporal, como entendiam nos anos oitenta.
Para Yamê Aram identificar a transexualidade como uma patologia é reafirmar que o aspecto anatômico e sexual é mais relevante na determinação do gênero do que o comportamento, o sentimento. “Não me sinto mulher simplesmente porque gosto de homens. Sinto-me mulher por que identifico em mim um conjunto de percepções de mundo que se entende como sendo feminino. Aliás, a maioria dos homossexuais masculinos que conheço gosta de homens, mas não vê muitas identificações com o gênero feminino”, conclui.
A arte imita a vida
O tema da transexualidade já foi bastante abordado nos cinemas. No dia 12 de novembro de 2012, foi a estréia nacional do filme “Laurence Anyways” de Xavier Dolan, o longa canadense mostra a incomum história de amor entre um transexual e uma mulher. Aos 30 anos, Laurence descobre-se transexual e escolhe adquirir a imagem feminina. Ele tenta salvar a relação que tem com a noiva depois de lhe anunciar o desejo de se tornar mulher. A história tem enfoque nas relações de afeto no núcleo da família e do casal. O diretor do filme, Xavier Dolan teve os seus três primeiros trabalhos indicados para o festival de Cannes.
No filme “Meninos não Choram” (Boys Don't Cry, 1999) Teena Brandon é uma menina que decide trocar de identidade, passando-se por um menino chamado Brandon Teena. Ela passa a viver exatamente como sua identidade, se apaixonando por outra menina, saindo com amigos e tudo mais. Porém, quando todos descobrem sua verdadeira identidade, uma onda de violência abala o local. No filme "Minha vida em cor de rosa" Ludovic Fabre, um garoto de sete anos que não se reconhece como menino, se veste se sente e comporta como uma menina e se depara com o preconceito de seus pais.



do site do IBDFAM

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Fiquei confuso desta dupla existência da verdade.


Fernando Pessoa

Livro do Desassossego



207

         Quantas coisas, que temos por certas ou justas, não são mais que os vestígios dos nossos sonhos, o sonambulismo da nossa incompreensão! Sabe acaso alguém o que é certo ou justo? Quantas coisas, que temos por belas, não são mais que o uso da época, a ficção do lugar e da hora?          Quantas coisas, que temos por nossas, não são mais que aquilo de que somos perfeitos espelhos, ou invólucros transparentes, alheios no sangue à raça da sua natureza!
         Quanto mais medito na capacidade, que temos, de nos enganar, mais se me esvai entre os dedos lassos a areia fina das certezas desfeitas. E todo o mundo me surge, em momentos em que a meditação se me torna um sentimento, e com isso a mente se me obnubila, como uma névoa feita de sombra, um crepúsculo dos ângulos e das arestas, uma ficção do interlúdio, uma demora da antemanhã. Tudo se me transforma em um absoluto morto de ele mesmo, numa estagnação de pormenores. E os mesmos sentidos, com que transfiro a meditação para esquecê-la, são uma espécie de sono, qualquer coisa de remoto e de sequaz, interstício, diferença, acaso das sombras e da confusão.
         Nesses momentos, em que compreenderia os ascetas e os retirados, se houvesse em mim poder de compreender os que se empenham em qualquer esforço com fins absolutos, ou em qualquer crença capaz de produzir um esforço, eu criaria, se pudesse, toda uma estética da desconsolação, uma rítmica íntima de balada de berço, coada pelas ternuras da noite em grandes afastamentos de outros lares.
         Encontrei hoje em ruas, separadamente, dois amigos meus que se haviam zangado um com o outro. Cada um me contou a narrativa de porque se haviam zangado. Cada um me disse a verdade. Cada um me contou as suas razões. Ambos tinham razão. Ambos tinham toda a razão. Não era que um via uma coisa e o outro outra, ou que um via um lado das coisas e outro um lado diferente. Não: cada um via as coisas exactamente como se haviam passado, cada um as via com um critério idêntico ao do outro, mas cada um via uma coisa diferente, e cada um, portanto, tinha razão.
         Fiquei confuso desta dupla existência da verdade.

do site Pessoa.art

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Seguradora e banco indenizarão ex-portador de leucemia por recusa em contratar seguro de vida

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou em R$ 10 mil a indenização pelo dano moral sofrido por um jovem no momento em que teve proposta de adesão a seguro de vida recusada pela seguradora, em razão de ter declarado que fora portador de leucemia. A Companhia de Seguros Aliança do Brasil e o Banco do Brasil (BB) responderão solidariamente pelo dano.

“Conquanto o direito securitário tenha notório viés econômico, é inegável que também apresenta acentuado componente social”, afirmou a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial.

Recusa em contratar
Em 2003, um estudante de publicidade teve a oportunidade de celebrar contrato de estágio com uma empresa do ramo. Entre os benefícios oferecidos pela empresa estava um seguro contra acidentes pessoais com a Aliança do Brasil, que é vinculada ao BB.

No momento do preenchimento da proposta de adesão ao seguro, ele declarou que havia sido portador de leucemia, mas que já estava integralmente curado, fato que comprovou por atestado médico. Entretanto, a seguradora recusou-se a contratar, alegando doença preexistente.

Diante disso, o jovem ajuizou ação de indenização contra a seguradora e o BB, por danos morais, alegando que a recusa de contratar seria ilegítima.

Sustentou que o consumidor não poderia ser discriminado por uma doença da qual já está curado e, ainda, que na pior das hipóteses, o seguro poderia excluir cobertura para danos decorrentes da doença declarada, mas não poderia recusar cobertura para qualquer outro risco.

Contestação

Tanto a seguradora quanto o BB contestaram, alegando a ilegitimidade da instituição financeira na demanda e, além disso, a regularidade da recusa, fundamentada nas normas da Superintendência de Seguros Privados (Susep) e no princípio da liberdade de contratar.

O juízo de primeiro grau julgou o pedido improcedente. O autor apelou ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que negou provimento ao recurso. Para o TJSP, a conduta da seguradora foi legítima e, por essa razão, não poderia gerar dano moral.

Segundo o tribunal estadual, “a seguradora não está obrigada a aceitar proposta feita pelo autor assumindo risco que não lhe é conveniente, nos termos da legislação civil”.

Indignação

No recurso especial direcionado ao STJ, a ministra Nancy Andrighi reconheceu a legitimidade do BB para figurar no polo passivo do processo, com base em precedentes semelhantes ao caso.

Ao analisar o recurso, a relatora deu ênfase a dois pontos principais. Em primeiro lugar, destacou que o fato de o autor não ter incluído na ação pedido de cumprimento de obrigação de fazer – no caso, de celebrar o contrato – não retira dele o sentimento de indignação que justifica seu pedido de indenização.

Em segundo lugar, ela mencionou que a recusa de contratar formulada pela Aliança, apesar de ter sido comunicada por correspondência privada, não ficou conhecida somente pelo autor, mas, presumivelmente, pelos colegas de trabalho e superiores hierárquicos.

Dessa forma, “a sua condição de ex-enfermo, que em princípio diria respeito somente a ele, foi exposta à coletividade com especial conotação limitativa”, afirmou a ministra.

Preço justo

De acordo com a ministra, a doença, da qual o paciente já estava livre, não poderia servir de justificativa para a exclusão na contratação do seguro. “O serviço deve ser-lhe oferecido pelo preço justo, seja esse preço alto ou baixo, consideradas as peculiaridades do promitente”, afirmou, acrescentando que, quando o consumidor realmente apresenta grau de risco maior, justifica-se o pagamento de prêmios mais elevados.

Para ela, a seguradora teria diversas alternativas à sua disposição: “Poderia oferecer-lhe cobertura parcial, para diversos eventos, excluindo os riscos inerentes à sua doença preexistente; poderia ter-lhe oferecido cobertura total a um preço mais alto; poderia solicitar exames adicionais, que apurassem se efetivamente ele havia se curado da doença. Mas não lhe poderia negar a prestação de serviços.”

Relação de consumo

Quanto à alegação de que a conduta da seguradora estaria amparada em normas da Susep, Andrighi afirmou que, ainda que a atividade securitária seja regulada por órgão específico, a contratação de seguros está inserida no âmbito das relações de consumo e, portanto, deve necessariamente respeitar as regras do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Ela mencionou que o artigo 39, inciso IX, do CDC dispõe que é vedado ao fornecedor de produtos ou serviços “recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento, ressalvados os casos de intermediação regulados em leis especiais”.

“A recusa da contratação, portanto, é possível, mas apenas em hipóteses verdadeiramente excepcionais. Rejeitar um consumidor, sem oferecer-lhe alternativas viáveis para a contratação, mediante o envio de mera missiva-padrão com a justificativa, em uma única linha, de doença preexistente, não é razoável”, concluiu a relatora.

Processo - REsp 1300116

do site do STJ

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Barriga de aluguel: o corpo como capital

Os avanços da ciência têm feito coisas de que até Deus duvidava. O método DNA desviou o eixo da investigação de paternidade, que era na verdade uma inquisição sobre a moral sexual da mãe, para uma questão científica. A biotecnologia abriu a possibilidade de inseminações artificiais homólogas e heterólogas. Todas essas tecnologias, associadas ao discurso psicanalítico, filosófico e jurídico, nos remetem hoje à compreensão de que filiação, paternidade e maternidade são funções exercidas. Em outras palavras, não interessa tanto quem gerou ou forneceu o material genético, prova isso o milenar instituto da adoção – pai ou mãe é quem cria. Daí a expressão criada pelo IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família e já absorvida pelo ordenamento jurídico brasileiro: parentalidade socioafetiva, que é também geradora de direitos e obrigações.
   
Muitas questões decorrentes da fertilização in vitro ou Reprodução Assistida – RA, que é a tecnologia de implantação artificial de espermatozóides ou embriões humanos no aparelho reprodutor de mulheres receptoras continuam sem uma resposta objetiva. Por exemplo, o que fazer com os embriões excedentes? Pode-se descarta-los? Eles podem ser implantados mesmo depois da morte de seus doadores? Tais questões têm interferido negativamente no avanço do Direito e principalmente em pesquisas que poderiam melhorar a vida e a saúde de muitas pessoas.
 
Uma das situações sobre a qual paira muito preconceito e impede a evolução jurídica é a possibilidade de homens e mulheres tornarem-se pais por meio da gravidez por útero de substituição. Conhecida também como barriga de aluguel, o método consiste em uma mulher gerar em seu útero filho de outra ou para outra. No século XIX, a medicina já havia desvendado os mistérios da concepção e ultrapassou concepções morais e teorias místicas e míticas sobre infertilidade. Foi assim que surgiu a Resolução 1957/10 do Conselho Federal de Medicina estabelecendo regras para a gestação de substituição e doação temporária de útero. Mas foi acanhada e continua deixando milhares de mulheres sem a possibilidade de serem mães por esta via. É que só podem “ceder” o útero quem for parente até segundo grau. A questão sobre a qual se deve refletir é: por que não se pode remunerar uma mulher pelo “aluguel” de seu útero? Sabe-se que no Brasil acontece na clandestinidade o que já é lei em vários países, a exemplo dos Estados Unidos, Israel, Austrália, Bélgica, Dinamarca, Grã-Bretanha, Grécia, Holanda, Israel, Índia, Rússia e Ucrânia.
 
O corpo é um capital físico, simbólico e econômico. Os valores atribuídos a ele são ligados a questões morais, religiosas, filosóficas e econômicas. Se a gravidez ocorresse no corpo dos homens certamente o aluguel da barriga já seria um mercado regulamentado. Não seria a mesma lógica a que permite remunerar o empregado no fim do mês pela sua força de trabalho, despendida muitas vezes em condições insalubres ou perigosas, e considerado normal? O que se estaria comprando ou alugando não é o bebê, mas o espaço(útero) para que ele seja gerado. Portanto não há aí uma coisificação da criança ou objetificação do sujeito. E não se trata de compra e venda, como permitido antes nas sociedades escravocratas e endossado pela moral religiosa. Para se avançar é preciso deixar hipocrisias de lado e aprender com a História para não se repetir injustiças. É preciso distinguir o tormentoso e difícil caminho entre ética e moral.
 
A regulamentação de pagamento pelo “aluguel”, ou melhor, pela doação temporária de um útero não elimina o espírito altruísta exigido pelo CFM; evitaria extorsões, clandestinidade e até mesmo uma indústria de barriga de aluguel. Afinal, quem não tem útero capaz de gerar um filho não deveria ter a oportunidade de poder buscá-lo em outra mulher? Por que a mulher portadora, que passará por todos os riscos e dificuldades de uma gravidez, não pode receber por essa trabalheira toda? Hoje as religiões já reconhecem que os bebês nascidos de proveta têm alma tanto quanto os nascidos por inseminação natural. Já foi um avanço. Quem sabe no futuro próximo, nesta mesma esteira da evolução do pensamento, alugar um útero para gerar o próprio filho, para aqueles que não querem adotar, passará da clandestinidade para uma realidade jurídica? Eis aí uma ética que se deve distinguir da moral estigmatizante e excludente de direitos.
 
Rodrigo da Cunha Pereira
 
Advogado em Belo Horizonte, presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família, doutor (UFPR) e mestre (UFMG) em Direito Civil. Autor de vários livros sobre os temas: Direito de Família e Psicanálise aplicada ao Direito de Família.



PEREIRA Rodrigo da Cunha . Barriga de aluguel: o corpo como capital . Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/novosite/artigos/detalhe/858. Acesso em09/11/2012

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Paying the bills with surrogacy fees

 

Surrogacy may be the “new normal” on American television -- glamorous, funny and quirky. But novelist Susan Straight paints a very different picture in an op-ed in the New York Times, “Making Babies, Just to Make Ends Meet”. She profiles “C”, a 39-year-old woman in her block of flats who has been a surrogate mother three times.
C has been married three times, the first time at 16. Her first husband was murdered; her second is in jail; her third can barely pay for the gas to drive his motorcyle to work. She has five children of her own.
Her three client-couples were a white man and a his Middle Eastern wife (she was paid US$30,000), a gay couple ($50,000), and a wealthy couple in their late 50s with four teenage boys who wanted a girl (this is a work in progress -- $35,000 on delivery).
Is it easy money? No, says Ms Straight:
‘I’ve given birth to three girls. I cannot imagine carrying a child for a stranger. When people say, “That’s so much money!” I say, “This is not a job where you take a break, lie down and rest, go on vacation for a week. She’s pregnant 24-7. Oh, and there’s the part where she could die.”’
Surrogacy may not be an easy way to make a buck, but for poor women without an education, it might seem like the only way. As surrogacy becomes more popular with infertile American couples and overseas couples from countries where it is illegal, we could be reading more stories like this.

do site Bioedge

terça-feira, 30 de outubro de 2012

A BIOÉTICA E O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

 
Luiz Antonio Miguel Ferreira
Promotor de Justiça/ SP
Resumo: O presente texto procura abordar a questão da bioética e sua relação com o Estatuto da Criança e do Adolescente, com especial atenção aos direitos fundamentais referentes à vida, à saúde, à liberdade, ao respeito e à dignidade. Trata, ainda, de estabelecer uma ligação entre tais direitos e a bioética e a implicação desta em relação à criança, nas questões estabelecidas pela lei menorista.
Índice Eletrônico do Documento
01. Introdução
Analisando a bioética, como um ramo do conhecimento multidisciplinar, verifica-se que o seu fundamento é a pessoa, estabelecendo-se uma relação ética na vida desta conforme se apresenta a origem grega da palavra, que nos remete ao significado: bíos – vida e éthiké - ética.
A vida, garantida com o nascimento da pessoa e seu posterior desenvolvimento, encontrou no Direito, um instrumento necessário para a sua efetivação. E a relação estabelecida entre o Direito e a Bioética tornou-se um instrumento que busca não só a garantia da vida, como também a sua dignidade, fixando parâmetros para a sua concretização e estabelecendo limites para distinguir o lícito do ilícito. Isso porque, enquanto na ética “busca-se as justificativas para as ações, a lei estabelece regras para as mesmas”[2]
Dentro deste contexto, o Estatuto da Criança e do Adolescente, por ser uma lei que trata especificamente deste segmento da comunidade, assume especial relevância, uma vez que traz em seu bojo a preocupação com o nascimento e desenvolvimento da criança e o reconhecimento desta como pessoa humana, com direito à dignidade.
Assim, a relação entre a bioética e o Estatuto da Criança e do Adolescente, como um ramo do Direito, assume especial relevância, a partir do momento em que se busca uma atuação ética nos problemas envolvendo a criança, com a garantia de seu nascimento e desenvolvimento. A questão é saber, como se traduz esta relação e qual a sua implicação na prática.
02. Bioética (conceito e fundamentos) e o Direito
Antes de serem analisadas as implicações decorrentes da relação estabelecida entre a bioética e o ECA, é importante ressaltar o seu conceito daquela e o fundamento e a relação estabelecida com o direito, para melhor compreensão do tema.
Desde o primeiro momento em que foi utilizado o termo Bioética, em 1970, pelo Prof. Van Rensselaer Potter, Doutor em Bioquímica e pesquisador na área de Oncologia da Universidade de Wisconsin/E.E.U.U., em artigo científico, posteriormente publicado no livro Bioethics: a Bridge to the Future (1971), o tema foi se desenvolvendo e aprimorando, estruturando-se com os avanços tecnológicos.
Utilizando-se do conceito na Encyclopedia of Bioethics pode-se definir bioética como sendo o “estudo sistemático da conduta humana no campo das ciências biológicas e da atenção a saúde, na medida em que esta conduta seja examinada à luz de valores e princípios morais”.
José Emílio Medauar Ommati[3] esclarece que a Bioética é um ramo do conhecimento transdisciplinar que sofre influências da Sociologia, Biologia, Medicina, Psicologia, Teologia, Direito, dentre outros, e que se preocupa, basicamente, com as implicações ético-morais decorrentes das descobertas tecnológicas nas áreas da Medicina e Biologia.
Seu fundamento é a vida da pessoa humana (numa visão ampla de vida que implica no nascimento, desenvolvimento da pessoa, e morte), buscando garantir a sua existência com dignidade, diante dos avanços tecnológicos e científicos, revelando implicações com a Engenharia Genética, clonagem, fecundação in vitro, eutanásia, aborto, transplantes de órgãos, qualidade de vida, meio ambiente, entre outros temas.
Em síntese, a bioética “busca essencialmente, um agir humano que aprimore a dignidade humana e a qualidade de vida, e culmine na apreciação de valores humanos” [4].
O avanço tecnológico, somado à capacidade de destruição do ser humano, revela a importância da bioética como ciência. No entanto, há necessidade de se estabelecer limites para à ação do homem. Este limite, é dado pelo Direito, através de normas e princípios que buscam assegurar a vida, o equilíbrio social e a dignidade da pessoa humana.
O direito à vida é consagrado no artigo 5º da Constituição Federal, como princípio fundamental. É a partir deste direito que a ação humana, guiada pela tecnologia, deve ser analisada e regrada, tendo como parâmetro a bioética.
Esta situação implica num desafio, que é
encontrar um equilíbrio (o justo meio aristotélico) entre o mundo dos valores e o mundo da ciência, sem cercearmos seus avanços, mas também sem permitir que sejam simplesmente incorporados à nossa vida novos conceitos e descobertas antes de terem sido submetidos a um rigoroso juízo de interesse moral e ético para a humanidade”[5].
Dentro deste contexto, o direito deve buscar o equilíbrio entre o progresso e benefício por ele trazido.
03. A criança e o adolescente e a Bioética
É nesse sentido, que atualmente o direito trata das questões envolvendo crianças e adolescentes. Porém, a criança, nem sempre foi considerada pelo Direito e pela Bioética como pessoa humana, possuidora de direitos fundamentais a serem preservados e garantidos.
São inúmeros os relatos de investigações científicas envolvendo crianças. O prof. José Roberto Goldim[6] esclarece que o teste da vacina para varíola humana, realizado por Edward Jenner, em 1768 foi efetuado em uma criança. A mesta situação ocorreu em 1885 com Louis Pasteur quanto testou a sua vacina anti-rábica. Em 1891, Carl Janson, da Suécia informou que suas pesquisas sobre a varíola estavam sendo realizadas em 14 crianças órfãs, apesar do modelo ideal serem bezerros.
A discussão envolvendo crianças em pesquisas científicas e o reconhecimento das mesmas como possuidoras de direitos, acarretou, paulatinamente, uma limitação das investigações, sendo que a primeira norma restritiva ocorreu na Prússia em 1901, onde a Instrução do Diretor das Clínicas e Policlínicas proibiu, explicitamente, a pesquisa em criança.
A esta norma seguiram-se Lei Nacional na Alemanha, em 1931 e o Código de Nuremberg, de 1947. A Declaração de Helsinki, proposta em 1964 e revista em 1989, possibilitou a participação de crianças e adolescentes em pesquisas na área de saúde, desde que ocorresse o consentimento dos responsáveis.
No âmbito nacional, existe a possibilidade de participação de crianças e adolescentes em pesquisas científicas, havendo a necessidade do consentimento do responsável e a informação do menor, em respeito ao princípio da autonomia. Nesse sentido, encontra-se a Resolução 041/95 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), que no artigo 12 estabelece:
“Direito de não se objeto de ensaio clínico, provas diagnósticas e terapêuticas, sem consentimento informado de seus pais ou responsáveis e o seu próprio, quanto tiver discernimento para tal”..
Na mesma direção, a Resolução n. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que no item IV 3, “a”, especifica:
“Em pesquisas envolvendo crianças e adolescentes, portadores de perturbação ou doença mental e sujeitos em situação de substancial diminuição em sua capacidade de consentimento, deverá haver justificação clara da escolha dos sujeitos da pesquisa, especificada no protocolo, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, e cumprir as exigências do consentimento livre e esclarecido, através dos representantes legais dos referidos sujeitos, sem suspensão do direito de informação do indivíduo, no limite de sua capacidade”.
Estas normas, surgiram após a promulgação da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente (lei n.º 9.099/90), que representam o marco para o reconhecimento da cidadania infantil, contemplando-os com o direito à vida, à saúde e à dignidade, implicando numa nova visão quanto a bioética.
04. O Direito à Vida e à Saúde no ECA
O direito à vida e à saúde está previsto nos artigo 5º “caput” e 227 da Constituição Federal, sendo que dentro do contexto menorista (artigos 7º à 14 do ECA), revela-se como prioridade absoluta, que deve ser efetivado através de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e desenvolvimento sadio e harmonioso em condições dignas de existência das crianças e adolescentes.
A primeira conclusão que se extrai da análise deste direito é que, o meio ou a forma pelo qual se garante o direito à vida e à saúde, é através de políticas sociais públicas e o objetivo destas políticas é garantir o nascimento e o desenvolvimento sadio das crianças e adolescentes, ou seja, o Estatuto não se satisfaz apenas com a garantia do nascimento da criança, quer ele propiciar meios para que a mesma cresça e se desenvolva. E mais, faz expressa referência às condições dignas de existência.
O Estatuto da Criança e do Adolescente apresenta, de forma separada e didática, as situações que implicam na garantia do nascimento da criança e as ações que devem ser executadas para o seu desenvolvimento.
Assim, as normas estampadas nos artigos 8º, 9º e 10º do Estatuto dão especial atenção ao nascimento, apresentando ações direcionadas à gestante, para possibilitar um parto com dignidade; regulamenta o atendimento pré e perinatal, apoio alimentar, aleitamento materno, registro dos prontuários e identificação do recém nascido, prevenção de anormalidades metabólicas e alojamento conjunta do neonato e da mãe.
Essas regras, apesar de aparentemente estampar direitos relativos à gestante, na verdade buscam garantir o direito do nascituro (nascimento sadio e harmonioso), daí porque foram inseridas no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Ao garantir a proteção à vida, procura afastar qualquer referência ao aborto ou experiências genéticas que venham a afetar o nascimento e a dignidade da criança. Garantindo a permanência do neonato junto à mãe, busca humanizar os ambientes dos hospitais e garantindo os exames visando ao diagnóstico de anormalidades no metabolismo, promove os direitos do paciente. Tais questões mostra a interface da bioética no ECA.
A seguir, após assegurar o nascimento, tratou o legislador menorista de garantir o desenvolvimento dessa criança. As regras dos artigos 11º, 12º, 13º e 14º referem-se ao atendimento médico da criança e do adolescente através do SUS; o atendimento especializado aos portadores de deficiência, inclusive com o fornecimento de próteses e medicamentos; garantia de condições para que, em caso de internação, permaneça na companhia integral de um dos pais ou responsáveis, e que os casos de suspeita ou confirmação de maus tratos sejam obrigatoriamente comunicados ao Conselho Tutelar. Por fim, traçou normas sobre a prevenção médica e odontológica e de vacinação obrigatória.
Estas ações, em sua totalidade, estão voltadas para a proteção e qualidade da vida de crianças e adolescentes, que devem almejar condições dignas de existência.
A aplicabilidade da lei, no que diz respeito a estes direitos, requer a possibilidade de sancionar o infrator, no caso de descumprimento. Assim, para a efetividade de tais dispositivos, estabeleceu o Estatuto, a ocorrência de crime e infração administrativa para algumas situações.
Os crimes previstos, referem-se aos encarregados de serviço ou dirigente de Hospitais que não cumprirem as obrigações impostas no ECA. quanto à manutenção de registro de suas atividades, fornecimento da declaração de nascimento (Art. 10), respondendo pela infração penal prevista no artigo 228 da citada lei.
O médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de atenção à gestante que não identificar corretamente o neonato e a parturiente na ocasião do parto ou não realizar os exames visando ao diagnóstico de anormalidades no metabolismo, também são responsabilizados criminalmente, por força da infração prevista no artigo 229 do ECA.
Como infração administrativa, a garantia do direito à saúde e à vida foi regulamentado no artigo 245 do Estatuto, que estabelece a obrigatoriedade do médico ou responsável por estabelecimento de atenção à saúde, entre outros, de comunicar à Autoridade competente, os casos envolvendo suspeita ou confirmação de maus tratos.
Observa-se do citado dispositivo, que diante da preocupação com a integridade física da criança e do adolescente, até os casos de suspeita de maus tratos, obrigam a comunicação.
05. A Liberdade, o Respeito e a Dignidade das crianças e dos adolescentes.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, ao estabelecer que as crianças e adolescentes, têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade (artigos 15 a 18) como pessoas em desenvolvimento, assegurando-lhes direitos civis, humanos e sociais, elevou-os à condição de cidadãos, retirando-os da condição de meros receptores de benefícios para satisfação de suas necessidades básicas ou de objetos de intervenção.
O direito à liberdade, pelo Estatuto
se volta especialmente contra constrangimentos de autoridades públicas e de terceiros, mas também contra os pais e responsáveis que, porventura imponham à criança ou ao adolescente um constrangimento abusivo que possa ser caracterizado como uma situação cruel, opressiva ou de violência ou, mesmo, de cárcere privado, o que pode até dar margem ao exercício do direito de buscar refúgio e auxílio.[7]
Está previsto no ECA, no artigo 16, e demonstra intrínseca relação com a Bioética, posto que garante o direito a opinião e expressão (II) da criança e do adolescente, que deve ser levando em consideração quando da realização de ensaio clínico, pesquisas e provas diagnósticas e terapêuticas. Este direito foi contemplado pela Resolução n. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. O direito à liberdade também compreende a liberdade de crença e culto religioso, o direito de brincar e divertir-se, buscar refúgio, auxílio e orientação.
Quanto ao direito ao respeito, o Estatuto da Criança e do Adolescente, refere-se à inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente que por sua vez abrange a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças dos espaços e objetos pessoais. O Estatuto, em obediência a tal direito, estabelece a obrigação de se colocar a criança e o adolescente à salvo de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
A inviolabilidade da integridade física, como forma de expressão do direito ao respeito, “consiste em não poder o cidadão ser submetido a atentados que venham comprometer parcial ou totalmente a integridade física”[8]. Assim, o direito ao respeito deve, em primeiro plano, assegurar a incolumidade física das crianças e dos adolescentes.
Ao tratar da integridade psíquica e moral, como parte do direito ao respeito, objetiva garantir às crianças e adolescentes, pleno desenvolvimento em condições de liberdade e dignidade, visando ao seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social (ECA., art. 3º), respeitando a sua condição de pessoa em desenvolvimento.
O direito à dignidade vem tratado no artigo 18 do ECA e resume-se no tratamento respeitoso que deve ser dispensado às crianças e adolescentes. O dispositivo legal impõe tal obrigação a todos, indistintamente, e não somente aos pais ou responsáveis.
A dignidade será alcançada quando a criança e o adolescente forem postos a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.
Segundo o Dicionário Aurélio, vexame é tudo aquilo que causa vergonha, afronta, ultraje; constranger é obrigar pela força, coagir, tolher a liberdade; desumano refere-se a tratamento bárbaro, cruel, bestial; aterrorizante reflete o ato que causa terror, pavoroso, fazer medo e violento o uso da força bruta. A criança e o adolescente devem ser postos à salvo desses tratamentos, como forma de respeito à sua dignidade.
Todos estes dispositivos têm relação direta com a Bioética e buscam garantir os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes, contra os avanços tecnológicos e científicos que venham a comprometer o seu desenvolvimento.
06. A bioética e o estatuto da criança e do adolescente.
O artigo 227 da Constituição Federal apresentou um novo paradigma para as crianças e os adolescentes, estabelecendo:
“É dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. (grifo nosso).
Observa-se do mandamento Constitucional, os parâmetros estabelecidos em prol das crianças e dos adolescentes, em todas as atividades que estiverem envolvidas. Tais parâmetros, como já analisado, foram digeridos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que apresenta a forma como tais direitos se concretizam.
O novo paradigma adotado pelo Constituinte em relação à população infanto-juvenil e devidamente especificado no Estatuto da Criança e do Adolescente é que deve nortear todas as questões que envolvam:
· Aborto;
· Reprodução artificial;
· Transplantes de órgãos (com reflexos na adoção internacional);
· Família - pátrio poder – paternidade e maternidade;
· Pesquisas científicas;
· Humanização dos hospitais;
· Consentimento da criança e do adolescente em procedimentos médicos;
· Identidade (com implicação na questão das clonagens).
Em todas estas situações, a ética deve proteger a criança e o adolescente e o direito (Estatuto da Criança e do Adolescente) reconhece e garante tal proteção, como prioridade absoluta. Revela tal assertiva, que eventual conflito entre os avanços tecnológicos e a criança e o adolescente, estes devem ser preservados, pois se tratam de pessoas em desenvolvimento que não podem ser objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade, opressão (Art. 5º do ECA), tratamento desumano, aterrorizante, vexatório ou constrangedor (Art. 18 do ECA), devendo ser respeitado e garantido o seu direito a vida, a saúde, a liberdade, respeito e dignidade.
07. Considerações finais
O desenvolvimento tecnológico e o progresso devem encontrar um meio para garantir o equilíbrio entre os benefícios a serem alcançados e o respeito à pessoa humana.
O equilíbrio, representado pela Bioética, nem sempre é levado em consideração, diante da natureza do homem. Quando isto ocorre, surge o Direito para retomar a condição inicial, restabelecendo a supremacia da pessoa, com proteção à sua vida.
Na área da infância, esta relação apresenta-se mais delicada, já que existe a opção de se garantir à criança e ao adolescente a prioridade absoluta para todos os direitos que lhe foram consagrados, tais como a vida, a saúde, o respeito, a liberdade e a dignidade.
Assim, a bioética encontra no Estatuto da Criança e do Adolescente, os parâmetros necessários para os problemas advindos do avanço biotecnológico, restando evidente que “nem tudo que pode ser feito, deve ser feito”.
A criança e o adolescente devem encontrar na bioética o significado que foi proposto por Darryl Macer da Universidade de Tsusuka no IV Congresso Mundial de Bioética (4-7/11/98) fundamentado no ideal universal do amor. Segundo o pesquisador, os quatros princípios básicos da bioética/amor, podem ser resumidos no: amor de si (autonomia), amor para com os outros (justiça), amor pela vida (não maleficência) e amor pelo bem (beneficência). Em termos de infância, nada mais “precioso para promover- lhe os direitos que o amor”, que é a principal força do universo.
NOTAS
[1] Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo.
[2] GOLDIM, José Roberto. Bioética e Interdisciplinaridade.
[3] Bioética e Direito. Disponível na Internet: www.geocities.com/collegepark/union/bioética.
[4] MIRANDA, Carolina Mastins. Justiça e vida autenticamente humana. In: SIQUEIRA, José Eduardo de. PROTA, Leonardo. ZANCANARO, Lourenço (Org.). Bioética. Estudos e reflexões. Londrina: Ed. UEL, 2000, pág. 48.
[5] MIRANDA, Carolina Martins. Obra citada, pág. 66.
[6] Pesquisa em crianças e adolescentes. Disponível na Internet: www.ufrgs.br/hcpa/gppg/bioética.htm.
[7] SILVA, José Afonso da. In: CURY, Munir et alii (coordenadores). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo: Malheiros Editores, 1992, p.66.
[8] MATTIA, Fábio Maria de. In: CURY, Munir et alli (coordenadores). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. São Paulo: Malheiros Editores, 1992, p.73.

do site da abmp

sábado, 27 de outubro de 2012

Peter Singer on abortion



by Michael Cook | Oct 23, 2012 |

Utilitarian ethicist Peter Singer spoke recently at the Stevens Institute of Technology on a wide range of election issues. Journalist John Horgan, who directs a centre for science writing there, reported the highlights inScientific American. He admired Singer's cool and detached analysis and his apparent compassion. Here are Singer's views on abortion, which came as a surprise to Horgan. 
First of all, he agreed with many pro-lifers that a fetus, even at six weeks, is a "living 
human being." He showed us slides of fetuses, 
because we should not "run away from what 
abortion is."
Singer nonetheless believes that abortion is ethical, 
because even a viable fetus is not a rational, self-aware 
person with desires and plans, which would be cut 
short by death; hence it should not have the same 
right as humans who have such qualities. Abortion 
is also justified, Singer added, both as a female 
right and as a method for curbing overpopulation.
For very different reasons than abortion opponents, 
Singer actually opposes Roe v. Wade.
Singer further surprised me--and showed his 
meta-commitment to democracy and reason-when 
he said that he, like Mitt Romney and his running 
mate Paul Ryan, disliked Roe V. Wade. That 1973 
Supreme Court decision, Singer felt, provides a 
flimsy rationale for abortion and has corrupted the 
process whereby Supreme Court Justices are chosen. 
Ideally, Singer said, voters rather than unelected 
judges should determine the legal status of abortion.
 Singer nonetheless acknowledged that if Roe V. Wade 
is overturned, some states might outlaw or severel
y restrict abortion. "I'm torn," he admitted.

do site Bioedge

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Magistrados do Rio de Janeiro recebem recomendação para solicitar informações da ANS, ANVISA, CFM e CFO

AVISO 1179
AVISO CGJ Nº 1179/2012*


O Desembargador ANTONIO JOSÉ AZEVEDO PINTO, Corregedor Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo inciso XX do artigo 44, do  Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Rio de Janeiro:

CONSIDERANDO disposto na Recomendação 36 de 12 de Julho de 2011;

CONSIDERANDO a constante busca do Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro pela implementação de práticas que visem facilitar e subsidiar os Magistrados nas demandas afetas à área de saúde.

CONSIDERANDO o decidido nos autos do processo administrativo nº 2012/118630.


AVISA aos Senhores Magistrados do Estado do Rio de Janeiro dotados de competência para julgar as Ações que versem sobre matéria de saúde, quer em face do Estado do Rio de Janeiro ou de seus respectivos Municípios, quer em face das Operadoras Privadas de Saúde, que quando possível e cabível, oficiem à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), ao Conselho Federal de Medicina (CFM), ao Conselho Federal de Odontologia (CFO), para se manifestarem acerca da matéria debatida dentro das atribuições de cada órgão, específica e respectivamente, sobre obrigações regulamentares das operadoras, medicamentos, materiais, órteses, próteses e tratamentos experimentais.
Este Aviso entrará em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 26 de Setembro de 2012.
Desembargador ANTONIO JOSÉ AZEVEDO PINTO
Corregedor Geral da Justiça

sábado, 20 de outubro de 2012

Justiça Inglesa Nega Direito à Eutanásia



Família perde batalha para permitir morte de vítima de danos cerebrais

Os médicos avaliaram que a mulher vive em estado de consciência mínima

Um juiz da Suprema Corte britânica negou os pedidos da família de uma mulher que sofre de danos cerebrais profundos e incuráveis, que reivindicava que fosse dado a ela o direito de morrer.

A mulher, de 52 anos e que vem sendo identificada apenas pela inicial ''M'', sofreu um dano cerebral intenso em 2203, após ter sido diagnosticada como portadora de encefalite viral, uma doença que atinge o cérebro.

Os médicos avaliaram que a mulher vive em estado de consciência mínima - considerada uma categoria acima do estado vegetativo.

Considera-se que pessoas em estado de consciência mínima possuem alguma noção do ambiente em que vivem e apresentam traços de memória ou intenção.

Foi a primeira vez que um tribunal britânico apreciou um pedido de permitir a morte de uma pessoa que é clinicamente dependente mas que não está em estado vegetativo.

'Vida dependente'

A família de ''M'', que está internada em um hospital, solicitou em 2007 que fosse interrompida a alimentação artificial e hidratação que ela vinha recebendo.

Os familiares da mulher argumentaram que ela não gostaria de levar uma ''uma vida que dependesse de outras pessoas''.

Mas o juiz Jonathan Baker, da Suprema Corte, apesar de reconhecer que a vida de ''M'' tem uma ''série de aspectos negativos'', acrescentou que ela é capaz de ter ''algumas experiências positivas''.

Durante seu testemunho, a irmã da mulher relatou que ''M'' ''não tem qualquer prazer na vida'' e que a rotina dela, que consiste em ser ''tirada da cama, colocada em uma cadeira e colocada de volta na cama'' não ''representa uma vida, é apenas uma existência''.

A família e seus advogados argumentaram ainda que ''M'' não é capaz de se comunicar de forma consistente, não pode se mover ou cuidar de si mesma de forma alguma e sofre dores e desconfortos constantes.

Eles disseram ainda que nos últimos anos ela não foi capaz de apresentar qualquer progresso em seu estado de saúde.

do site da abrame.org

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

I’m not the Nazi; you’re the Nazi


Julian Savulescu, the utilitarian bioethicist at Oxford University, has the perfect riposte when his opponents tell him that his proposals for genetic selection remind them of Nazi eugenics.
The real Nazis, he contends, are people who want to restrict the freedom to perform genetic tests on embryos.
Professor Savulescu is currently in his native Australia and appeared on the current affairs debating program Insight yesterday evening (transcript here). In response to a question, he declared that a ban on genetic testing is “profoundly immoral because people’s liberty to do things should only be restricted when they’re harming other people.“
FoetusHe argues that parents should be allowed to create the best children possible with genetic testing. He expanded on this in an article in The Australian:

 


“We should use the emerging knowledge from genetics to have not just healthier children, but children with better genes. We should give chance a helping hand.”
This includes the right to sex selection and destruction of embryos with genetic defects as well as selecting embryos with genes for intelligence, athletic ability or altruism and empathy. Australian legislation, however, only allows parents and IVF clinics to select for genetic defects.
“The targets of the Nazi and other eugenic programs, widely employed at the time in the United States and Europe, were people with intellectual disability, the poor and criminals. The Nazis would have fully approved of the current system of eugenics, which focuses on diseases, including genetic disorders which cause intellectual disability like Down Syndrome and Fragile X syndrome.”
In his TV debate, he insisted that parents have an obligation to try to have healthier children. “Life will always be difficult. Why make it more difficult?

do site Bioedge

Ética Jurídica - Fertilização in Vitro e Registro de Nascimento


autora: Maria Aglaé Tedesco Vilardo
 
            O problema ético na aplicação do Direito possui um horizonte prático relevante. A identificação deste horizonte deve ser feita em contraste com o horizonte teórico.

            A filosofia busca constituir situação que permita contemplar a verdade na sua dimensão prática tendo em vista que o ser humano é um ser movido pelo desejo e tem por objetivo a felicidade.

Aristóteles, pai da ética, afirma que “o homem é naturalmente um animal político, destinado a viver em sociedade” e que a moderação das paixões é o caminho da felicidade.  Para o filósofo, a Lei deve ser capaz de compreender as limitações do ser humano, suas paixões e instintos, e produzir instituições que promovam o bem e reprimam o mal. A lei não deve moldar o real, mas o contrário, a realidade deve moldar a lei, assim, ela será passível de cumprimento.

A essência da virtude se encontra na moderação entre os extremos de cada paixão, o caminho do meio. Para ele o conhecimento é dividido entre o conhecimento prático e teórico, o primeiro sendo o conhecimento de como agir corretamente e o segundo o conhecimento do que é bom por si mesmo. 

Estabelece como fonte da ética a noção de que a Felicidade (eudaimonia) é recompensa dos virtuosos. Aristóteles propõe uma sociedade na qual as instituições tentam harmonizar estes sentimentos básicos dos seres humanos de forma a produzir o melhor resultado possível para que o bem individual e o bem coletivo sejam harmônicos. Busca uma Ética do Possível, que não desrespeite a paixões humanas, mas antes as oriente pelo caminho da ponderação até a maturidade racional do equilíbrio.

Com base na teoria ética de Aristóteles destacamos o caso que segue para breve exame.

PARECER Nº 82/2010_E_ PROCESSO Nº 2009/104323- Procedimento Administrativo – Corregedoria Geral de Justiça do Tribunal de Justiça de São Paulo
REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS _ Assento de nascimento _ Filha gerada mediante fertilização in vitro e posterior inseminação artificial, com implantação do embrião em mulher distinta daquela que forneceu o material genético _ Pretensão de reconhecimento da paternidade pelos fornecedores dos materiais genéticos (óvulo e espermatozóide) _ Cedente do óvulo impossibilitada de gestar, em razão de alterações anatômicas _ “Cedente do útero”, por sua vez, que o fez com a exclusiva finalidade de permitir o desenvolvimento do embrião e o posterior nascimento da criança, sem intenção de assumir a maternidade _ Confirmação, pelo médico responsável, da origem dos materiais genéticos e, portanto, da paternidade biológica em favor dos recorridos _ Indicação da presença dos requisitos previstos na Resolução nº1.358/1992 do Conselho Federal de Medicina, em razão das declarações apresentadas pelos interessados antes da fertilização e inseminação artificiais _ Assento de nascimento já lavrado, por determinação do MM. Juiz Corregedor Permanente, com consignação da paternidade reconhecida em favor dos genitores biológicos _ Recurso não provido.

 

O Ministério Público do Estado de São Paulo interpôs recurso contra a decisão do Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do Distrito de Barão Geraldo, da Comarca de Campinas, que afastou a recusa de lavratura de assento de nascimento de criança com imputação da paternidade aos fornecedores de materiais genéticos utilizados para fertilização in vitro e inseminação artificial em mulher que, sem ser a produtora do óvulo, autorizou a prática do ato com a exclusiva finalidade de permitir o desenvolvimento do embrião e o seu futuro nascimento.

            A alegação fundamentou-se no fato de que a maternidade é presumida pela gestação e que o contrato entre as partes não supera este princípio e que devem prevalecer os interesses da criança, o que ocorrerá com a lavratura de assento de nascimento que retrate a estrita veracidade quanto à paternidade e maternidade, de forma a assegurar a preservação da dignidade humana.

O Ministério Público considera que a lavratura do assento de nascimento na forma pretendida não possibilitará o futuro conhecimento, pela criança, de sua real origem, porque ocultará a verdadeira maternidade. Além disso, não existe regulamentação legal para a prática pretendida pelos recorridos, o que impõe maiores cautelas e impede, por sua vez, a presunção de paternidade e maternidade tão só pelas declarações apresentadas pelos interessados, nas quais se inclui a do médico responsável pela fertilização e pela inseminação. Tece comentários sobre a possibilidade de manipulação genética vedada ou ilegal. Afirma, por fim, que a genitora que deu à luz não tem parentesco com os supostos pais biológicos, o que contraria resolução do Conselho Federal de Medicina destinada a impedir a comercialização do útero. Requer o provimento do recurso para que seja determinada a lavratura do assento de nascimento em nome da mulher indicada como genitora na Declaração de Nascido Vivo, com remessa dos interessados às vias ordinárias para a solução de eventual litígio relativo à paternidade e maternidade.

O Juiz Auxiliar da Corregedoria da Comarca da Capital de São Paulo, Dr. José Marcelo Tossi Silva, em 19/3/2010 emitiu parecer no sentido de se manter o registro em nome dos pais doadores dos gametas. Fundamentou seu parecer afirmando que diante da inexistência de legislação específica deveria ser observado que o Conselho Federal de Medicina, no campo da ética, regulamentou a conduta de seus membros, na denominada “gestação de substituição”, por meio da Resolução nº 1.358/92.

Acrescentou que a solicitação de registro foi instruída com “Declaração de Nascido Vivo” do hospital onde a criança nasceu, além dos documentos: “Termo de Consentimento para Substituição Temporária de Útero” constando os “Pais Genéticos”, ou seja, fornecedores do óvulo e do espermatozóide, e  “Doadores do Útero” ; “Termo de Consentimento Pós Informado para FIV/ICSI”; “Termo de Consentimento Pós-Informado para Criopreservação de Pré-Embriões/Embriões após Fertilização In Vitro”; declaração prestada pelo médico confirmando a origem dos materiais genéticos que resultaram na fertilização e inseminação artificiais; declaração da gestante no sentido de que foi submetida a inseminação artificial de embrião fertilizado com uso de materiais genéticos alheios e de que não tem pretensão de assumir a maternidade da criança assim gerada.

Diante da ausência de regulamentação legislativa, a solução para as situações concretas, ocorridas a fertilização in vitro e a posterior inseminação artificial em “cedente de útero”, ou “mãe-de-substituição”, deve prevalecer o melhor interesse da criança desse modo concebida e nascida, o que, neste caso concreto, corresponde à lavratura do assento de nascimento com base na verdade biológica da filiação.

Os documentos são concludentes no sentido de que a concepção e paternidade sempre foi desejada pelos pais biológicos, doadores dos materiais genéticos utilizados na fertilização in vitro, prestando-se a cedente do útero a servir para a gestação e parto, sem qualquer intenção de assumir a maternidade da criança. Assim, declarou por escrito.

Evidente que a lavratura do registro em desconformidade com a verdade biológica será prejudicial à criança que nenhum sustento e educação receberia da gestante.

O parecer foi aprovado pelo Corregedor Geral da Justiça, Des. Antonio Carlos Munhoz Soares, em 26/3/2010.

            Ao analisarmos o caso sob o enfoque da ética de Aristóteles destacamos que os doadores dos gametas, movidos pelo desejo da paternidade/maternidade (“o ser humano é um ser movido pelo desejo”) e impossibilitados de realizá-lo naturalmente, tiveram que realizar a fertilização em vitro com a ajuda de outra mulher que pudesse gestar em seu útero um embrião oriundo do óvulo e espermatozóide do casal.

            O objetivo do casal era a felicidade em serem pais e os avanços biotecnológicos permitiam alcançar tal felicidade. Como Aristóteles preconizou “ A lei não deve moldar o real, mas o contrário, a realidade deve moldar a lei, assim, ela será passível de cumprimento”. Assim, o casal, diante da real possibilidade da gestação de substituição, criou situação não prevista especificamente em lei. Todavia, houve a preocupação dos médicos em regulamentar eticamente a gestação de substituição através da resolução mencionada que criou alguns parâmetros básicos para que ocorresse. Claro que são caminhos a seguir, porém não há determinação de que não possam ser relativizados como foi no caso mencionado, ante a ausência de parentesco da gestante com os doadores ( “A essência da virtude se encontra na moderação entre os extremos de cada paixão, o caminho do meio”).

            Os avanços biotecnológicos permitem a realização deste desejo, a felicidade pode ser alcançada através da ciência. O registro civil em nome dos pais doadores pode ser realizado sem exame de DNA ou processo de investigação de paternidade, pois “propõe uma sociedade na qual as instituições tentam harmonizar estes sentimentos básicos dos seres humanos de forma a produzir o melhor resultado possível para que o bem individual e o bem coletivo sejam harmônicos”. Não se verifica a geração de instabilidade na sociedade ao se autorizar que os doadores, munidos de atestados e declarações da veracidade dos fatos, registrem diretamente seu filho, pois além do próprio bebê ter o direito ao seu registro civil em nome dos pais doadores, em razão do seu melhor interesse (ser criado por aqueles que lhe desejavam intensamente), há permissão social para tal concepção, inclusive regulamentada por resolução médica.

O direito ao registro é consectário lógico da cidadania. Exigir-se processo judicial e exame de DNA e vedando-se o imediato registro, coloca-se em questão a realização de atividade médica de fertilização trazendo constrangimento aos contratantes – tanto à gestante, quanto aos doadores (“as paixões humanas devem ser orientadas pelo caminho da ponderação até a maturidade racional do equilíbrio”).

Desta forma, conclui-se que ao indicar o caminho do meio encontrou-se a maturidade racional do equilíbrio. A possibilidade científica que permite às pessoas terem acesso a conquistas ainda não regulamentadas por lei deve ser amparada em sentido amplo com a concessão de todos os direitos civis decorrentes daquele ato.  O planejamento familiar é fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, conforme art. 226, § 7º da Constituição Federal, cabendo ao Estado propiciar os recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito. Complementar a essa obrigação do Estado, encontra-se o direito a tornar público, através do registro imediato, o nascimento da criança ocorrido em razão de progresso científico.