ROMA - As mães de aluguel e os famosos voltaram às manchetes com a nova filha de Nicole Kidman e Keith Urban, nascida em 28 de dezembro de uma barriga alugada. Esta notícia veio à tona logo após a de que Elton John e David Furnish se tornaram pais de um bebê no dia de Natal. Eles se unem a uma longa lista de famosos que usaram mães de aluguel para ter filhos. O catálogo inclui casais como Sarah Jessica Parker e Matthew Broderick, o ator Neil Patrick e David Burtka, e a estrela do futebol Cristiano Ronaldo. O caso de Nicole Kidman e de Keith Urban atraiu as atenções por causa de uma declaração do casal na qual agradeciam à "portadora gestacional". Melinda Tankard Reist, no jornal The Australian, criticou a expressão, por unir a coisificação dos corpos das mulheres e a comercialização do parto. Num artigo em 19 de janeiro, Reist argumentou que esta linguagem impessoal arranca a humanidade da mulher que teve o bebê, além de negar a intensa relação entre mãe e filho que se desenvolve durante a gravidez. Miranda Devine, no Daily Telegraph de Sydney, em 19 de janeiro, também criticou com dureza a expressão utilizada: "Mesmo tendo sido paga, como acontece com a maioria das mães substitutas nos Estados Unidos, o que ela fez foi um ato de enorme generosidade pessoal, que não deveria ser menosprezado com palavras equívocas que desumanizam a relação humana mais íntima". Acessório Devine afirmou sentir-se incômoda com a atual moda de bebês de mães de aluguel, como se fosse uma espécie de acessório, ou, no caso dos casais homossexuais, uma declaração política. Michelle Higgins, em comentário publicado pelo Sydney Morning Herald de 21 de janeiro, disse compreender a dor das mulheres estéreis, mas se opôs a termos como "criadora" ou "portadora gestacional". Importa muito a nossa escolha da linguagem para descrever a maternidade de aluguel, afirmava ela, porque isso impacta as pessoas envolvidas. Na Inglaterra, em artigo do Guardian de 21 de janeiro, Yvonne Roberts defendia que a maternidade é muito mais que um ramo da indústria varejista. Alugar barrigas é simplesmente desumanizador, enfatizou. Pode-se dizer que uma mulher escolheu ser mãe de aluguel por vontade própria, mas isto pressuporia que vivemos numa sociedade sem graves diferenças de poder e de renda. Existem "recantos da alma nos quais quem tem a carteira cheia não deveria entrar", acrescentava Roberts. Outros colunistas, por sua vez, apoiaram a maternidade de aluguel. Letitia Rowlands, em 22 de janeiro no Daily Telegraph, sustentou que era um final feliz para os casais que de outro modo não poderiam ter filhos. Na Austrália, as mães de aluguel só podem receber o pagamento dos gastos médicos, mas Rowlands se mostrava a favor de comercializar esta prática, alegando que os casais desesperados por ter filhos teriam mais oportunidades. Outros dois artigos, publicados no dia seguinte, na edição dominical do Daily Telegraph, também defendiam a maternidade de aluguel. Claire Harvey a denominava "extraordinário presente de amor". As mães de aluguel oferecem a partilha dos seus dons da boa saúde e da fertilidade em benefício de quem não tem a mesma sorte, afirmava ela. "É um presente deliberado de compaixão, paciência e amor de uma mulher para outra". Tracey Spicer contou suas próprias dificuldades para dar à luz e afirmou que há milhares de mulheres que sofrem do problema de infertilidade, mas reconheceu que, em alguns casos, como quando se contratam mulheres de países como a Índia para dar à luz para casais ocidentais, existe injustiça. A referência de Spicer à Índia toca um dos pontos sensíveis do tema. No último 10 de dezembro, o Wall Street Journal publicou um longo artigo sobre a nova indústria da produção de bebês utilizando mulheres de países de renda baixa. O PlanetHospital, por exemplo, utiliza mulheres de países como a Bulgária e as leva para dar à luz na Grécia, onde os impostos da operação são mais baixos. Ou oferece o "pacote indiano", que combina doadoras de óvulos e transferência de embriões a várias mães substitutas na Índia. Cobrando um pouco mais, o PlanetHospital dividirá os óvulos da mesma doadora para fertilizá-los com esperma de doadores diferentes, ou deixará os casais escolherem o sexo do filho. Desde 2007, a organização facilitou cerca de 460 nascimentos. Direitos e pagamento O uso crescente da maternidade de aluguel fez explodir, porém, uma série de batalhas judiciais. Na Inglaterra, onde o pagamento acima ou abaixo do necessário para cobrir os custos médicos teoricamente não é permitido, um juiz pôs em dúvida recentemente a interpretação das leis. Numa sentença, o juiz Hedley afirmou que não estava claro o direito a pagar pela maternidade de aluguel, e permitiu que um casal britânico ficasse com seu filho recém-nascido mesmo sem terem pagado mais do que a lei denomina "gastos razoáveis" à mãe de aluguel norte-americana, informou em 8 de dezembro o London Telegraph. O juiz interpretou que a lei se aplica só ao "caso claríssimo" de maternidade de aluguel para obtenção de lucro. Anthony e Shawn Raftopol se casaram legalmente em Massachusetts em 2008, e seus filhos gêmeos nasceram graças a um óvulo doado e a uma mãe de aluguel. Vivem na Holanda e estavam preocupados porque Shawn, que não é o pai biológico, viaja com os meninos e poderia ser acusado de tráfico de crianças. A corte sentenciou, ante as objeções das autoridades de Connecticut, que não havia necessidade de um processo de adoção para que Shawn fosse incluído nas certidões de nascimento. Pouco tempo depois, o Tribunal Familiar de Melbourne, Austrália, adotou um parecer similar, conforme o Herald Sun de 22 de janeiro. Um casal homossexual, que tinha pagado a uma mãe indiana para dar à luz as suas filhas gêmeas, obteve pleno status legal para o pai não genético. "Embora a palavra ‘pai', segundo o direito, tende a sugerir alguma conexão biológica, a biologia na realidade não importa; tudo está ligado à responsabilidade parental", decidiu o juiz Paul Cronin. Algumas vezes as mães substitutas não querem entregar as crianças quando elas nascem, o que leva a disputas na Justiça. Um caso que pendeu para o lado da mãe aconteceu recentemente na Grã-Bretanha, onde uma mãe substituta ganhou o direito de ficar com a criança. O juiz Baker explicou em sua sentença que a criança deveria ficar com sua mãe biológica, posto que era o melhor interesse da mesma, informava o Telegraph no dia 23 de janeiro. Ilícito No documento de 2008 Dignitas Personae, sobre questões de bioética, a Congregação para a Doutrina da Fé reafirmava a oposição da Igreja à utilização de mães de aluguel. O texto confirma o que a Donum Vitae tinha estabelecido 20 anos antes. Naquele documento, a Igreja explicava que qualquer técnica de natalidade que implique outras pessoas que não sejam o casal é inaceitável e contrária à unidade do matrimônio e à dignidade da procriação da pessoa humana". Também assinala que é uma negação do direito dos filhos a serem concebidos e trazidos ao mundo no matrimônio e pelo matrimônio. A natureza do vínculo existente entre os cônjuges atribui aos esposos, de maneira objetiva e inalienável, o direito exclusivo de ser pai e mãe somente um através do outro, acrescenta. Não se trata de negar a dor de um casal que não pode ter filhos, mas evitar que mães de aluguel resolvem um problema criando muitos outros. |
quinta-feira, 26 de maio de 2011
Barriga de aluguel na berlinda
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