sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Família israelense luta na Justiça para que óvulo de filha morta seja fecundado

Nascimento sem mãe

A israelense Chen Aida Ayash, de 17 anos, morreu atropelada na semana passada. E, agora, seus pais precisam provar que ela gostaria de ter filhos. Explica-se: a família obteve na Justiça uma autorização inédita para que os óvulos da menina sejam coletados e congelados. Falta convencer os juízes a deixar o material ser fecundado por espermatozóides doados — o que abre uma discussão ética e legal sobre o nascimento sem mãe.
Poucos são os países com legislação sobre a colheita póstuma de óvulos. No Brasil, o Conselho Federal de Medicina permite, desde o início do ano, o uso de sémen, óvulo e embriões de parceiros mortos previamente congelados — desde que com autorização prévia do(a) falecido(a). A medida é proibida na maioria dos países desenvolvidos, como Alemanha Dinamarca, Espanha e França.
Nos EUA, a práticas é permitida, mas com restrições. Há dezenas de casos sobre extração de espermatozóides de cadáveres — sempre com autorização concedida pelo morto. No ano passado, porém, juízes e médicos vetaram o desejo de uma família, desejosa de extrair óvulos de uma aeromoça, vítima de um ataque cardíaco. A negação foi justificada pela ausência de qualquer manifestação pública, por parte da comissária, de seu desejo de ter filhos.
O consentimento também pode ser vital no caso de Chen. A Corte permitiu que seus óvulos fossem extraídos junto aos outros órgãos — que serão encaminhados para doação —, mas a fecundação só virá se a família provar que ela gostaria de ter filhos. O que pode ser difícil, considerando sua pouca idade.
— Este é um caso único; é a primeira vez que uma Corte israelense aprovou a extração e congelamento de óvulos de uma mulher morta — ressalta Maayan Maor, porta-voz do Hospital Kfar Sava, para onde o corpo de Chen foi levado. — Não sabe¬mos por que os pais dela querem fazer este procedimento.
Advogado da Nova Família, organização que promove direitos familiares, Irit Rosenblum defende que a vontade da menina seja soberana:
— Se conseguirem provar que ela queria constituir uma família, não vejo razões para impedir isso.
Para Cláudio Lorenzo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Bioética e professor do Programa de Pós-Graduação em Bioética da UnB, uma procriação como a desejada pela família de Chen não deveria ser permitida.
— Trata-se de uma manifestação de desespero motivada pelo luto — opina. — A procriação com um óvulo de uma pessoa morta só deve ser permitida se ela era parte de um casal e manifestou claramente este desejo. Se aprovarmos esta prática sem que ela tenha sido expressão de uma vontade, então estamos considerando a vida um mero instrumento.
Pediatra e professor de Bioética da UFMG, Joaquim César Mota pondera que, sendo de uma cultura ocidental, onde as mulheres demoram mais para procriar, dificilmente Chen teria manifestado seu desejo em constituir família.
— Era uma adolescente, que sequer tinha autonomia legal plena. É muito difícil que se consiga comprovar um desejo sério, por parte dela, de ter filho — ressalta. — Fazer uma vida humana em laboratório é banalizar algo que ainda precisa ser preservado. Parece mais um desejo dos pais de repor alguém que perdeu.

do site do Globo

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