terça-feira, 9 de agosto de 2011
Técnica de fertilização garante nascimento de bebê sem gene responsável por câncer de mama
Antônio Marinho
RIO - A medicina deu mais um passo importante para reduzir a incidência de câncer de mama. Médicos espanhóis apresentaram ontem um bebê que, graças à técnica de fertilização in vitro, nasceu sem o gene BRCA1, um dos responsáveis por 5% a 10% dos tumores malignos de mama, e presente no cromossomo 17. Antes, só se conhecia um caso desse tipo, na Grã-Bretanha. O método poderá ser aplicado em outros cânceres.
O feito na Espanha foi possível graças ao diagnóstico pré-implantação, que seleciona os embriões sem mutações genéticas. Foi a primeira vez que a Comissão Nacional de Reprodução Humana do país autorizou o procedimento - realizado por médicos do hospital de Sant Pau, da Fundação Puigvert de Barcelona e da empresa Reprogenetics - para evitar câncer de mama.
Na Espanha, o diagnóstico genético pré-implantação só era permitido em doenças causadas por um só gene e incuráveis. A autorização foi dada porque a mãe do bebê tem antecedente familiar de tumor de mama e ovários em idade precoce e com alta mortalidade. Portadores de genes BRCA1 e BRCA2 sofrem com muita frequência de tumores de mama, ovários e pâncreas.
- Esse tipo de tumor apresenta um alto risco de mortalidade, além de necessitar de tratamento traumático e radical - afirma Joaquim Calaf, responsável pelo setor de ginecologia e obstetrícia de Sant Pau. - A técnica poderá ser aplicada em outros genes que têm caráter familiar e hereditário.
A probabilidade de que os pais transmitam o gene a seus filhos é de 50%, explica Teresa Ramon y Cajal, do setor de câncer hereditário em Sant Pau. Na família do bebê espanhol foram registrados vários casos de tumor maligno. A mãe é portadora do gene familiar e sofria de problemas de fertilidade.
No Brasil, a técnica é usada há 15 anos para evitar doenças como fibrose cística, hemofilia, anemia de Fanconi e outras alterações cromossômicas. Nesses casos, antes do tratamento de fertilização in vitro, é coletado material da mucosa da boca do casal para estudo do genoma dos pais e para identificar possíveis genes que possam causar doenças, diz o médico brasileiro Márcio Coslovsky, especialista em Reprodução Humana na Clínica Huntington no Rio. Depois do resultado, retira-se uma célula do embrião para análise genética.
Então o material é submetido à técnica de PCR (sigla em inglês de reação em cadeia da polimerase) para separar os embriões sem o genes para a doença pesquisada. Só depois disso é feito o implante. A equipe de Coslovsky aplicou a técnica para doença neurodegenerativa Tay-Sachs, que se manifesta quando bebê herda genes alterados da mãe e do pai.
- A mãe está no terceiro mês de gravidez e seu bebê nascerá sem a mutação - diz o médico.
Identificação inédita de mutação
Na opinião de Marcello Valle, especialista em Reprodução Humana da Clínica Origen, o que o acontecimento na Espanha traz de novo é a identificação não de uma doença, mas de uma mutação para câncer de mama. As portadoras do gene BRCA1 têm 85% de risco de desenvolver câncer de mama.
- Acredito que a aplicação da técnica poderá ter impacto na redução dos riscos de câncer no futuro - afirma.
A Comissão Nacional de Reprodução Humana da Espanha estuda liberar o procedimento para nascimento de um bebê sem o gene que predispõe a um câncer de intestino. Apesar do sucesso, os médicos dizem que ele não se aplica a todos os pacientes com antecedentes familiares de câncer hereditário e que é preciso estudar caso a caso.
Aqui, a nova resolução do Conselho Federal de Medicina (1.957/2010) para reprodução assistida diz que as técnicas de reprodução humana "não devem ser aplicadas com a intenção de selecionar o sexo ou qualquer outra característica biológica do futuro filho, exceto quando se trate de evitar doenças ligadas ao sexo do filho que venha a nascer". E que intervenção com fins terapêuticos sobre embriões in vitro "não terá outra finalidade que não a de tratar uma doença ou impedir sua transmissão, com garantias reais de sucesso, sendo obrigatório o consentimento informado do casal".
do site do Globo
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